Ano de 2009
O elevador descia fazendo barulho e sacudindo um pouco, como se fosse desmanchar a qualquer momento. Ele se segurava olhando para os lados com algum receio de que isso acontecesse de verdade. À medida que eles desciam, a temperatura aumentava cada vez mais. Satnan parecia não se incomodar com o calor, talvez porque já estivesse acostumado. Mas ele ofegava cada vez mais e na metade do caminho, o suor começava a escorrer pelo seu rosto. Aquilo parecia um elevador para o inferno.
– A que profundidade temos que ir? – Adrian perguntou ofegante.
– Três mil e quinhentos metros. – Satnan respondeu. – tive que procurar por toda índia por isso. Já foi a mina de cobre mais profunda do mundo.
Quando o elevador chegou ao seu destino, o condutor puxou uma alavanca para fazê-lo parar e outro homem parecido com Satnan veio abrir a porta.
– Lembra do meu irmão Rhadib? É um estudante agora.
– Namaste, Sr. Helmsley. – ele cumprimentou educadamente, com as duas mãos postas como se estivesse em oração.
– Adrian, esquece o senhor. – O doutor respondeu cordialmente, procurando evitar o tratamento cerimonioso.
Enquanto Adrian ia entrando mina adentro, Rhadib falou para o irmão em tom urgente.
– Precisa de mais gelo. A máquina de gelo está quebrada!
– Então usa menos gelo, tá? – ele respondeu com calma diante da situação. Apesar de não ter gostado muito da resposta, Rhadib se conformou e abaixou-se para pegar os vários baldes de gelo que estavam no chão.
– Consegue trabalhar nessa sauna?
– Até que hoje não está tão ruim, amigo. – Satnan falou alegremente colocando uma mão sobre o ombro dele. – Às vezes o calor aqui chega a 50 graus!
Os dois entraram em uma sala repleta de equipamentos, máquinas de medição, computadores e mainframes. Várias luzes piscavam e relatórios eram impressos a todo momento. Ventiladores foram colocados em várias partes numa tentativa de abrandar um pouco aquele calor infernal.
– Esse é o meu colega Dr. Lokesh, professor de física quântica da universidade da China. – o indiano apresentou um cientista que trabalhava no laboratório.
– Namastê.
Satnan foi até um grande computador cuja tela mostrava gráficos e medições.
– E então, o que temos aqui? – Adrian perguntou se colocando do seu lado.
– Como pode ver são neutrinos se movendo normalmente. – ele começou apontando alguns gráficos na tela. – uma massa minúscula, sem carga elétrica.
Adrian colocou os óculos para poder enxergar melhor. Seu amigo continuou.
– Eles atravessam a matéria comum quase sem afetá-la.
– Você disse que a contagem duplicou nas últimas erupções solares.
– Isso foi na semana passada. Vem cá ver o que aconteceu nos últimos dois dias.
Eles foram para outro ponto do laboratório. Seus rostos estavam banhados em suor e seus cabelos molhados como se tivessem tomado banho.
O indiano chegou a outro computador que mostrava uma imagem do sol durante uma das suas erupções solares. O astro-rei soltava uma grande rajada de fogo e ele falou.
– Essa é uma das maiores erupções da história humana, que causaram uma contagem de neutrinos nunca registrada!
– Meu Deus... – Adrian balbuciou de maneira pausada, com os olhos vidrados na tela e acompanhando cada grande rajada que o sol expelia.
– Não é isso que me preocupa, Adrian. Pela primeira vez, os neutrinos desencadearam uma reação física!
Adrian balançou a cabeça levemente.
– Isso não é possível!
O clima tenso foi rompido temporariamente com um barulho vindo do outro lado do laboratório. Era o irmão de Satnan jogando um balde de gelo em uma bacia onde um dos cientistas tinha mergulhado os pés. O homem de um suspiro gostoso.
– Isso sim que é um alívio!
Satian voltou-se novamente para Adrian e falou.
– Por favor, me acompanhe.
Os dois foram até uma sala escura, onde tinha um enorme tanque de água cercado pelos lados e coberto por uma grossa tampa.
– Você não vai acreditar. Mike, Godof! – ele ordenou a dois homens que abrissem a tampa do tanque e continuou – esse tanque de água chega até dois mil metros de profundidade. Parece que os neutrinos vindos do sol sofreram uma mutação para um novo tipo de partícula nuclear.
Um dos homens girou uma manivela, abriu o lacre e Satnan abriu a grossa tampa do tanque, fazendo com que uma grande nuvem de vapor saísse de lá de dentro e explicou para um Adrian totalmente pasmo e incrédulo.
– Estão aquecendo o núcleo da terra. – enquanto falava, ele ofegava em parte pelo calor e também pela gravidade da situação. – e agindo como microondas.
Com o coração acelerado, o suor escorrendo em bicas e a adrenalina correndo pelo seu corpo, Adrian aproximou-se mais da abertura do tanque e ficou chocado ao ver a água lá dentro borbulhando, como se estivesse sendo aquecida pelo fogo direto. Considerando que o tanque tinha dois mil metros de profundidade, ele então se deu conta de que a situação era realmente grave e decidiu que providencias tinham que ser tomadas o quanto antes.
Mais do que depressa, ele pegou o primeiro avião para Washington, EUA, a procura de alguém que precisava saber daqueles estranhos fenômenos.
O taxi estacionou em frente ao luxuoso Hotel Lincon justo durante uma festa elegante. Adrian pagou o taxista e entrou rapidamente no hotel. Enquanto ele se dirigia apressadamente ao salão de festas, o anfitrião falava alegremente aos convidados enquanto segurava uma taça de champanhe. Ele era um homem gordo, branco, com cabelos pretos e um ar arrogante. Seu nariz era meio achatado e suas bochechas lembravam um pouco as de um buldogue.
– Senhoras e senhores, como prometido: sem discursos! Somente um muito obrigado porque nesta noite, graças a sua generosidade, nós levantamos 1,7 milhões de dólares! – ele falou dando uma entonação especial ao citar o valor arrecadado.
Os convidados aplaudiram felizes e satisfeitos.
– E agora podem encher a cara!
Adrian tentou entrar e foi barrado por dois seguranças, um careca e outro com ar esnobe como se fosse dono da festa.
– Tudo bem, olha só: eu trabalho para a casa branca. – ele falou mostrando os documentos.
– Não interessa para quem o senhor trabalha. Só entra com traje a rigor.
O aspecto do cientista não era dos melhores. Ele saíra tão apressado da Índia que sequer teve tempo para tomar banho e vestir uma roupa melhor. Foi quando ele viu um conhecido dentro da festa e o chamou sem perder tempo.
– Scotty!
Um homem de óculos e aspecto meio abobalhado o atendeu, indo até a entrada para falar com ele.
– Oi! Adrian, eu pensei que estivesse na índia. Como vão as coisas?
Sorrindo e tentando não perder a linha por causa da gravidade da situação, Adrian pediu.
– Me dá seu paletó!
– Heim?
– Eu tenho que falar com o Anheuser!
– Mas eu não quero...
– Me dá logo o paletó por favor! – ele falou perdendo a paciência.
Ao ver que ele estava prestes a se apresentar de forma mais decente, os seguranças deixaram que ele passasse.
Quando o outro lhe deu seu paletó, ele pegou os documentos da sua mochila, vestiu-se rapidamente e correu a procura do anfitrião da festa.
– Sr. Anheuser! – ele foi chamando procurando atrair a atenção do homem que conversava distraidamente com um senhor de cabelos brancos. – preciso falar com o senhor.
Ele pediu licença ao convidado e aproximou-se de Adrian, falando em voz baixa e mostrando visível enfado pela sua invasão a sua festa.
– Hum... eu o conheço?
– Desculpe. Eu sou Adrian Helmsley, geólogo do departamento de ciência e tecnologia do governo. – ele se apresentou educadamente.
Anheuser virou-se para os outros convidados, sorrindo de maneira forçada.
– Me dêem licença. – e voltando-se novamente para Adrian ele falou em tom de reprimenda. – esse é um evento para levantar fundos, uma festa entre amigos.
– É muito importante, senhor!
– Sempre é. – ele falou ironicamente e em tom de troça – Olha, você vai fazer o seguinte: marque uma reunião com a minha... quer saber? Pede para o seu chefe tocar no assunto na próxima reunião trimestral. – levantando levemente a taça e se preparando para despedir, ele arrematou - É assim que se faz.
Diante da situação, Adrian se desesperou um pouco e falou aumentando o tom de voz, sem se importar com quem estivesse ouvindo.
– Eu viajei vinte horas para chegar até aqui, senhor! Eu estou sem dormir a dois dias! O senhor precisa ler isto e precisa ler já! – o cientista falou num tom levemente enérgico.
Vendo que os convidados tinham percebido a pequena agitação e olharam para os dois em silêncio, Anheuser pegou os documentos e falou em tom de troça, procurando desfazer o clima tenso que tinha se formado.
– Deixa eu adivinhar: uma crise geológica nacional? – todos riram junto com ele e a festa transcorreu normalmente. – com licença.
Ele entregou sua taça para alguém e foi para um lugar mais reservado, passando por Adrian e lhe atirando um olhar fulminante. A princípio ele pensou que não fosse nada de grave e pretendia dar uma boa lição naquele jovem atrevido que tinha invadido sua festa para lhe trazer problemas desagradáveis.
No entanto, à medida que ele ia lendo os documentos, sua expressão foi se tornando cada vez mais preocupada e assim ele se deu conta do que estava acontecendo.
– Seu supervisor é quem? – ele perguntou para Adrian já sem aquele tom de troça de antes.
– Lee Cavassos.
– Agora não é mais. – rapidamente ele pegou o celular para fazer uma ligação e fez para Adrian um sinal para que ele o seguisse. – All, traz o carro . – ele disse de forma lacônica para a pessoa que o atendeu e após guardar o aparelho, voltou-se para Adrian novamente e falou num tom mais descontraído. – Devia ter tomado um banho.
– Como?
– Vamos falar com o presidente.